Faleceu hoje a Dra. Maria
Emília Tracana. Com ela faleceu uma grande fatia da cultura portuguesa e da
animação sociocultural.
Não tenho mais palavras,
senão aquelas que deviam ser ditas nestas circunstâncias, mas que não sei
proferir.Vitimada por doença incurável, com ela foi o que encontrei de mais puro e mais profundo na dedicação a uma causa, a uma escola, à cultura e a uma região.
Ela dedicou-se à Escola Profissional e aos seus alunos; fê-lo a tempo inteiro com uma tal dedicação como não encontro paralelo. Ela dedicou-se ao traje e confeccionou (ela própria e segundo o seu desenho) trajes desde o séc. XII ao séc. XVII (mais de 250 peças), de todos os estratos sociais; teatro; música; pintura; banda desenhada; culinária; produtos regionais (Feira da Castanha e Feira das Tradições); coleccionismo; jornalismo; etnografia; olaria; escultura; exposições (a dos 100 anos da República, que levou a várias cidades); actividade cívina na direcção da Confraria das sartdinhas Doces; actividade municipal, como deputada da Assembleia Municipal de Trancoso; cinema (porque participou num filme); jogos tradicionais… Tudo que fosse arte, animação, alegria, empenho, ela estava lá.
Há 15 dias atrás, impossibilitada de sair do leito, falou-me de um sonho, um seu projecto que não tivera oportunidade de concretizar: escrever um livro sobre os 20 anos de animação sociocultural. Prometi-lhe que a ajudava. Trabalhei dia e noite, juntando milhares de recortes de imprensa, fotografias, inúmeros artigos seus publicados em jornais e revistas. Consultei-a; minha filha recolheu oralmente impressões suas e passou-as a escrito. Procurei ajuda na Escola Profissional. Lutei contra o tempo, imaginando que a Dra. Emília teria oportunidade de ver o seu livro publicado; porque é o seu livro, do seu trabalho, do que ela deixou escrito e que eu, contando com as suas indicações preciosas, levaria até ao prelo (levaria, não – levarei. Estou decidido a fazê-lo).
Perdi a corrida, porque a doença da Dra. Emília foi mais rápida.
Não tenho mais palavras. Só digo que mantenho a promessa de publicar o livro dela, porque a sua acção, a sua actividade, o seu dinamismo, a sua entrega aos outros – mais do que a si própria – , as centenas de alunos que ela acompanhou, designadamente nas Provas de Aptidão Profissional, nos eventos que ela iniciou em várias cidades e concelhos e que continuam como marcas indeléveis do seu talento, impõem essa vontade.
Assim, coloco aqui uma fotografia dela e duas outras, daquele evento (um de muitos) que hoje continuam e que ela tão bem conseguiu recriar , ano a ano – As Bodas Reais de D. Dinis e D. Isabel de Aragão; uma outra, a mais recente participação dela e dos seus alunos e colegas professores no programa da RTP1, Praça da Alegria.
À Dra. Emília, parceira na cultura, a saudade que é a sua ausência, a sua Amizade desinteressada e empenhada.
Para sempre.
Fernando,
ResponderEliminarSinto o quanto terás sofrido com a perda de tão ilustre senhora. Na vida é assim, os espíritos mais iluminados, as almas mais ricas, as pessoas mais interessantes passam por este mundo num relance, e deixam de brilhar quando ainda tinham muito de si para dar em favor dos outros. Pelo resumido currículo da Drª. Emília Tracana, aqui registado por ti, avalio o vasto e diverso trabalho feito pela Drª. Emília. Ela foi e continuará a ser um exemplo para muita gente jovém, e o seu acervo cultural não deixará de ser aproveitado pela edilidade trancosense. Tambem estou certo de que tu, Fernando, irás empenhar-te em concretizares o desejo da Drª. Emília, ou seja, registar em livro os "20 anos de animação cultural", testemunho do génio criativo que agora se extinguiu. A sua memória ficará, assim, viva no espírito dos trancosenses, a quem ela dedicou parte da sua vida.
Não a conheci, mas a dôr, surge por osmose.
Paz à sua alma.
Um abraço.
Sim, foi uma perda como o são aquelas que não são facilmente substituíveis. Ela regia-se por princípios éticos de grande valia e possuía um dinamismo cativante, capaz de prender e arregimentar às suas ideias os menos crentes e os mais empedernidos para estas coisas da cultura e animação.
ResponderEliminarEra, sobretudo, uma democrata. Sem confrontar politicamente quem quer que seja, era um Abrilista e manifestamente Republicana, pensando pela sua cabeça.
Era muito amiga da minha filha Elisabete, que foi sua aluna, visitando-se diariamente até á hora da morte e pintando (porque essa arte era comum às duas) os quadros que serviam em exposições, colóquios e outros eventos congéneres.
Foi minha parceira, designadamente quando eu fui presidente do conselho de administração da Trancoso Eventos - a empresa que dava corpo à Festa da História e gere todos os espaços lúdico-culturais do concelho. Pugnava pelos seus alunos, era uma fera quando alguém denegria a imagem desses jovens e suportava, por vezes, ela prória, os custos da actividades inetentes às PAP's (Provas de Aptidão Profissional), que eram circuito obrigatório no penúltimo ano do currículo escolar do Curso de Animador Sociocultural.
Lembro-me que um dia, tendo eu combinado com o Manuel Pena e o Jorge Esteves da RTP1, umas filmagens em Moreira de Rei para o Portugal Em Directo, três horas antes de gravarmos lembrei-me de lhe telefonar para que ela comparecesse com meia dúzia de alunas, trajadas à época (séc. XII) junto à igreja românica de Moreira, que tu conheces. E ela, pondo-se ao volante do seu Golf, desencantou as alunas, vestiu-as e, meia hora antes, estava pronta a entrar no directo comigo, como entrou.
Não, vou emendar-me: julgo que não é mesmo substituível.
Abraço
Só hoje encontrei este cantinho aqui, eu sou a menina da foto vestida de D. Isabel de Aragão, fui da Escola (2005/2008) e tive a honra de ser aluna dessa preciosidade que hoje está junto a Papai do Céu! Obrigada pelas palavras lindas sobre ela e obrigada Trancoso, por receber uma brasileira de braços abertos!
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