Ainda do 3º volume da minha obra "Contos de Amor e Drama" sai agora este que tem por título "A MENINA E O LULU. Possui um final inesperado, o qual não estará aqui disponível porque só revelo a primeira página. Que querem? É a vida!...
Como quem encontra o que quer, encontra tudo, a senhora
foi logo direta ao assunto:
— O senhor é uma espécie de detetive que descobre
pessoas desaparecidas?
— Procuro pessoas desaparecidas, sim. Descobri-las,
por vezes, é um pouco mais difícil — respondi numa humildade pouco consentânea
com os magros proventos da arte. — Além disso, tenho de contar com a
concorrência dos parceiros televisivos Ponto
de Encontro, Os Mais Procurados e Casos de Polícia.
— Ora, apenas me interessa que o senhor se encarregue
do meu caso. Mais nada.
— E quem desapareceu à senhora? O marido, um filho, o
velho pai alquebrado e senil?
— O meu cãozinho. O meu lulu Bolinhas, uma das criaturas mais adoráveis que conheci ao cimo da
Terra.
Depois de me desassombrar, especulei sobre o desaparecido:
uma bola branca, lavadinha e a cheirar a baunilha, tosquiada e com aqueles
horrorosos berloques, tipo cordeiro-perneta, que abandonam os detritos
malcheirosos pelas calçadas da cidade.
— Vai ver que o bicho entra pela porta quando menos
esperar.
— O meu adorável bichano foi raptado!
Pior ainda. Quem se dava ao trabalho de raptar uma
"coisa" daquelas? Eu, por exemplo, não o queria nem dado, pois mal
tinha para a bucha, quanto mais para veterinários, salões de beleza género boutique du chien, perfumes e refeições
que deviam custar o dobro das que eu pagava no restaurante da esquina.
— Dois energúmenos — continuou ela — que vinham numa
mota, lançaram-se sobre o pobre bichano quando eu ia a sair do carro com ele ao
colo. Ainda mandei o meu motorista em sua perseguição, mas o senhor sabe como
são estes bandidos das motas.
Retirou da carteira uma foto do "botão de
rosa" e passou-ma para as mãos, antes mesmo de eu recusar a entrada
naquela missão canina. Não me enganei na aparência que teci mentalmente do
canídeo. Decididamente não queria encontrar o mimalho! Ia dizer-lhe isso, ao
mesmo tempo que lhe devolvia a foto, quando ela lançou para os meus tímpanos
duas razões de peso que me levaram a reconsiderar: a primeira consistiu no
valor astronómico da recompensa, que eu nunca me atrevi a debitar na procura de
gente humana; a segunda foi o esclarecimento sobre a falta que o bicho fazia à
menina, filha da senhora. Aceitei o encargo.
Depois de me inteirar de alguns pormenores relacionados
com o lugar onde e o quando do rapto inopinado, acelerei o que pude para entregar o lulu
vivo nas mãos das donas e receber o "taco", que me dava para gastar à
grande. Nova luz surgiu no caso, quando a senhora me telefonou, dizendo-me que
os raptores prometiam entregar a criatura, mediante uma quantia de monta.
Não me perguntem como, mas após umas visitas a essas
lojas de animais, pareceu-me reunir alguns elementos que me conduziam aos
mafiosos raptores de lulus de companhia. A cor da mota, a zona onde foi cometido
o dislate e tudo o resto estavam a encaixar na pista que eu propunha aquecer.
Tinha quase desvendado o imbróglio quanto ao paradeiro do bicho, logo havia de
me aparecer aquela miúda, daquelas que nos conseguem fazer pensar em nada, a
não ser nelas. Eu não sou muito desse género, mas acontece.
— Sei que não quer ser incomodado, mas não o farei
perder tempo. Quanto quer o senhor para deixar de procurar o Bolinhas?
Fiquei parado a olhar para ela. Ofereciam-me dinheiro
para encontrar o cão, logo depois uma outra proposta para deixar de o fazer.
Fiquei intrigado.
— Está a referir-se a um lulu raptado por dois jagunços?
— Exato. O cão pertence-me.
— O mesmo afirmou outra senhora, de mais idade, em
relação ao que julgo ser o mesmo animal.
— Essa senhora é minha mãe — afirmou, peremtória.
— Nesse caso, o cão também é da sua irmãzinha mais
nova...
— O cão é só meu! Não tenho irmãzinha mais nova.