Em 8 de Março deste ano trouxe aqui o tema “contribuição”
e volto para repeti-lo, a pedido de “várias famílias” e porque ontem, numa confraternização, saiu-me esta do bestunto. Por essa altura, lembrou-me
da “coisa” a propósito dos nomes que a estrangeirada deu à “Geringonça”, que também
é um Imposto – e não uma Contribuição – uma vez que governa sem ser directamente
votada para ficar em primeiro lugar para governar. Se isto é confuso, eu vos confundo
neste poço de perplexidades sem fundo. O caso das traduções do vocábulo Portasiano
por essas línguas-de-trapos para além de Vilar Formoso tem dado que falar; pelo
menos, foi o que li num semanário abandonado e perdido numa sarjeta (quando o seu
lugar seria num ecoponto), na altura em que não tinha trocos nem pachorra para
comprar um em primeira mão.
Mas vamos aos vocábulos...
CONTRIBUIÇÃO. Durou muitos anos este termo “contribuição”, designadamente
nos diplomas fiscais e na própria designação da entidade que superintende – a Direcção
Geral das Contribuições e Impostos. Com a queda do que se chamava, muito
despropositadamente contribuições, a própria designação da direcção geral
deixou de conter esse termo e passou a ser conhecida como Direcção Geral dos
Impostos, embora mantivesse a sigla DGCI.
Disse despropositadamente e disse bem, porque a contribuição
pressupõe quem contribua com um propósito generoso, direi mesmo voluntário. E
não era esse o caso.
Acabou o termo? Nada disso! Então como é que se chama,
ou que outro nome tem, a contribuição audiovisual? E o que são as chamadas
“contribuições extraordinárias”? Quando até a própria e o Banco Alimentar Contra
a Fome, bem como a Wikipédia pedem “contribuições”!...
Uma coisa é dizer: eu contribuo para a AMI, porque
tenho pena dos mais necessitados; outra será dizer: eu contribuo para o IMI,
porque tenho pena dos menos carenciados. Para além disso, convenhamos que se o
IMI fosse contribuição, seria designado por COMI (Contribuição Municipal de
Imóveis) – logo, se o predicado exige sujeito, ou vice-versa, se COMI, comi
alguma coisa…
Não se queixem os que contribuem com as filas de espera
para cumprirem o sagrado dever de contribuir, alegando terem de deixar os
filhos e os netos sozinhos em casa, pois o primeiro-ministro Costa disponibiliza-se
para ficar com eles nesse ínterim.
O que contribui chama-se contribuinte, pessoa que o
devia fazer graciosamente, segundo a etimologia da palavra. E não o faz. A não
ser que seja um filantropo ou altruísta, mesmo assim para outras causas. Há
quem ache que o contribuinte é um mecenas ou um trabalhador sem direito a
féria. Aquele que foi actor e presidente americano muito antes de Trump, que se
chamou Reagan, disse mais ou menos isto: “O contribuinte é o único cidadão que
trabalha para o governo sem ter de prestar concurso.”
Também se pode meter neste saco todo aquele “chico”
que contribuiu para os dez mil milhões nas “offshores”, na órbita da frase
keynesiana de que evitar os impostos é a "única actividade que actualmente
contém alguma recompensa".
O livro do ex-presidente da república, que levou o título
“As Quintas-Feiras e Outros Dias” bem que podia ter outro título, mais
apelativo, capaz de catapultar estas memórias para uma cifra equivalente à
publicação das de Obama – 60 milhões (!). Se fosse eu, chamar-lhe-ia “As
Quintas-Feiras e Outras Contribuições”. Mas, confesso, eu também não teria
pachorra nem capacidade para escrever memórias deste quilate.
O certo é que o termo contribuinte constitui um paradoxo, tal como essoutro que se chama fuga ao fisco, quando, o que vemos, é os ditos contribuintes, em vez de fugirem, fazerem "fila" à porta das repartições para cumprirem a obrigação, ainda que, no íntimo, desejassem que o papel para pagamento da contribuição fosse metido num sítio recôndito e íntimo, como serventia.
O certo é que o termo contribuinte constitui um paradoxo, tal como essoutro que se chama fuga ao fisco, quando, o que vemos, é os ditos contribuintes, em vez de fugirem, fazerem "fila" à porta das repartições para cumprirem a obrigação, ainda que, no íntimo, desejassem que o papel para pagamento da contribuição fosse metido num sítio recôndito e íntimo, como serventia.
Voltemos à família contribuição e imposto, cujo parentesco,
no seio das designações fiscais, deve andar à volta de primos. Não havia uma
redundância de designações para o mesmo fim? Não entrava tudo no mesmo saco,
pela via da mesma caixa? Logo, um estava a mais.
Não estava, disso vos garanto. Os catedráticos aludem
a diferentes significados técnicos para a existência dos dois ramos, coisa que
eu não contesto.
O próprio termo imposto, se quisermos, já significa
contribuir (concordo, por imposição), tanto assim que os serviços fiscais
tratam por contribuintes os pagadores de impostos e não por impostores. Nalguns
casos, sinceramente, mais impostores que contribuintes.
FOSSADO. Este devia ser o mais exótico dos impostos, se fosse
aplicado aos proprietários e produtores de porcos bísaros, pata negra ou
malhados de Alcobaça. Mas não. Quem fossava para este imposto não eram os
suínos, que já os havia em larga escala, mas os trabalhadores da gleba, através
da sua mão de obra para serviços de construção de castelos ou fortificações
militares, bem como o serviço militar a que estavam obrigados os cavaleiros
vilãos e peões.
Era, como se compreende, um imposto em espécie, sendo
a espécie o trabalho e a prestação de serviços. Não era chegar à tesouraria ou
ao multibanco e toma-lá!... Saía do corpinho e tinha o benefício de não
sujeição às argoladas da liquidação e das omissões no e-factura, coisas que acontecem desde a ocorrência do pecado original.
E quem se escusasse ao fossado? Tal como hoje – e
sempre – teria uma multa ou coima, que se chamava fossadeira e não era mais
suave do que as suas congéneres de hoje.
Mais tarde, este encargo passou a ser remido a dinheiro,
uma vez que o valor é semelhante para todos os sujeitos passivos e os cofres
não engordavam com o suor alheio. Digo isto porque, sendo um imposto
generalizado, alguns sornas e menos trabalhadores contribuíam com uma fatia
menor, o que não era justo. Já na altura passava a ideia de que pagar imposto
fazia mal à saúde.
Tinha de haver penalidades para os
faltosos. Então, tal como agora, código que fosse código, não ficaria completo
sem este saboroso capítulo. Fossadeira, de início, era a multa que tinham de pagar
os que faltavam ao fossado. A fossadeira, como multa, podia então ser paga em
géneros, talvez mesmo em bitcoins da
época, através de um estratagema subtil e semelhante àquele que só podia surgir, mais tarde, em cachimónias de
hodierna gente.
Imagina-se a satisfação dos cobradores ao ouvirem o "cantar" das moedas no fundo do cofre, muito semelhante à de um melómano a uma partitura de Bach.
Imagina-se a satisfação dos cobradores ao ouvirem o "cantar" das moedas no fundo do cofre, muito semelhante à de um melómano a uma partitura de Bach.
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