segunda-feira, 9 de outubro de 2017

O MEU LIVRO DAS CURIOSIDADES - D.QUIXOTE

Quando me sinto com bonomia para não fazer, como se costuma dizer, a “ponta de um corno”, envolvo-me com um livro de apontamentos e uma esferográfica preta para juntar curiosidades à longa lista das que “pesco” aqui e ali. Disto já falei noutro post, mais atrás.
Quando a bonomia se transforma em tédio e não me sinto tentado a fazer colheres com o vagar ou a ir para junto de um rochedo e talhar um megálito, passo esses apontamentos manuscritos para um ficheiro que trago a congestionar a memória do computador.
Quando quero colocar um travessão nas “postagens” para não expor apenas a Banda Desenhada, e por saber de antemão que este blog nunca será um imaterial monumento nacional, mesmo tendo como pedra de armas o célebre Bandarra, sinto-me tentado a mendigar retalhos da minha obra engavetada, encaixotada e penada em “drives” informáticas.
É o caso de hoje. Do tal livro manuscrito, à passagem digital sequente, encontrei hoje uma tirada sobre o D. Quixote, assanhado em arruaças e toleimas onde eu não me queria ver.
Miguel de Cervantes, o autor de D. Quixote de la Mancha, um dos mais belos romances que até hoje foram escritos, não deixou incólume D. Alonso Quijano, o infeliz fidalgo da “triste figura”. No meio ano das suas andantes cavalarias, entre pancadas de criar bicho, o magro fidalgo ficou assim marcado: meia orelha arrancada por Sancho de Azpetia; levou murros nas mandíbulas de um atávico arrieiro de Marritornes até perder os sentidos; ainda uns pontapés por parte do mesmo arrieiro enquanto estava no leito; levou murros na boca, dados por um estalajadeiro, que castigou assim ver os seus odres esfaqueados; mais murros no rosto por parte de um pastor de cabras; foi apedrejado pelos pastores, amolgando-lhe algumas costelas e ferindo-o nos dedos da mão direita; foi espancado com a própria lança por um moço, depois deste a desfazer em pedaços; foi agredido com um cantil de azeite na estalagem por um quadrilheiro da Santa Irmandade (como na maioria das ditas irmandades, espalhando amor e sarrabulho), de que surgiram dois galos na cabeça; foi mordido e arranhado no nariz por um gato em casa dos duques; passou-lhe por cima uma vara de porcos e recebeu patadas de uma manada de vacas; foi agarrado pelo cabreiro pelo pescoço na tentativa de o estrangular, à semelhança do que lhe fez o dito quadrilheiro da Irmandade; ainda sem contar com a difícil situação vivida pelo cavaleiro andante nas velas do moinho.

Será caso de perguntar se eu, no lugar de Cervantes, faria o mesmo à minha personagem. Pois bem, faria, tal como fiz a uma outra, recuperada por mim da tradição oral - o Padre Costa de Trancoso. Se o de Cervantes acometia moinhos, o meu sacerdote acometia mulheres. Entre um e outro, não venha o diabo escolher, porque prefiro que o faça o leitor.

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