JANELAS. Devem estar abertas na passagem do ano e as luzes
acesas, para assim receber o ano novo com bonomia. O mesmo se deve fazer com as
portas, principalmente a da entrada da casa. É claro que também se estará
sujeito a receber o amigo do alheio, mas devemos lembrar-nos que somos
“assaltados” com taxas, impostos, alcavalas e portagens, mesmo com tudo
fechado.
JOGOS. O único jogo que parece ser do agrado das bruxas –
para além dos que praticam nas salas de bingo – é o de jogarem com os bebés
depois de os retirarem dos berços durante a noite. É uma espécie de ténis sem
raquete, mas com o preciosismo de Maria Sharapova e Roger Federer. Devolvem as
crianças logo que desponte a manhã, sem um único arranhão ou fralda suja.
Quando não têm outra ocupação mais gratificante, as
bruxas quebram o protocolo, juntam-se e fazem uma perninha de quatro para
jogarem scrabble ou simplesmente, a solo, preencherem palavras cruzadas ou às
voltas com o portátil para moerem a paciência no freecell.
LAPSOS. Este aviso é para toda a navegação que singra nestes
mares. Cuidado com os enganos, principalmente nos esconjuros!
Por exemplo: para que uma criança não esteja sujeita a
bruxedos, deve rezar-se o credo na cerimónia do baptismo com cuidado, pois um
engano atrairá irremediavelmente a bruxaria.
LIVROS. Para além do Manual das Bruxas, que deve ter uma
edição limitada, semelhante às da banda desenhada portuguesa, há outras obras
escritas por atrevidos que não pescam nada do assunto (como é o meu caso) e que
parágrafo sim parágrafo não metem os pés pelas mãos, limitando-se a copiar e
colar o que vão espreitando pelas ligações do Google.
Bruxa que se preze deve possuir o Grande Livro de São Cipriano, bem como o Primo Basílio, a maior
parte – se não toda – a obra de José Rodrigues dos Santos e a colecção dos
anuários de estatística do INE.
As bruxas, no entanto, têm um “livro das sombras” que
elas próprias escrevem à mão (hoje devem fazê-lo no mais recente Microsoft
Word) como se fosse um diário. Este livro tem a particularidade de não
sobreviver ao autor, ao contrário das obras premiadas com o Nobel da
Literatura. Este livro deve ser queimado logo após o último suspiro da bruxa.
Querer pretender adquirir livros de bruxaria e feitiçaria
à moda antiga pela internet, é como tentar encontrar online um catálogo de zarabatanas de paxiúba do Amazonas (não
confundir com os livros vendidos na Amazon,
embora haja por lá obras mais eficazes que as zarabatanas do rio Içana).
LOBISOMENS. Não há município que se preze sem que apresente uma
lenda local em que entre um lobisomem. Para ser mais exacto, são os lobisomens
e as mouras encantadas quem preenche a maior parte do repertório tradicional
destas terras.
O lobisomem ou homem lobo, que na forma erudita se diz
licantropo é um ser lendário e mitológico. Transforma-se em noites de lua cheia
e só volta à forma natural e humana pelo amanhecer. Não contam os que acamaradam
pelas vielas do Bairro Alto.
Para se entrar melhor no espírito da superstição e do
seu folclore, é melhor seguir estes items.
- Quando nascem, do mesmo casal, sete filhos machos ou
sete filhos fêmeas seguidos, e se não forem uns padrinhos dos outros, qualquer
deles pode vir a ser lobisomem.
- Se num casal nascem sete rapazes, o último será
lobisomem; se sete raparigas, a última será bruxa. Com os baixíssimos índices
sintéticos de fecundidade, com 1,25 filhos por casal em média, ainda com as
também pequeníssimas taxas brutas de reprodução, não admira que estejam em vias
de extinção as duas classes.
- Um filho gerado entre compadre e comadre virá a ser
lobisomem. Não se comenta, por não se conhecerem as estatísticas.
- Também se pode transformar em lobisomem a criança
cujo padrinho se esqueça de dizer certas palavras durante a cerimónia do
baptismo.
- Para que uma criança, fadada para ser lobisomem não
o seja, deve dar-se-lhe o nome de Bento, se for rapaz, e Jerónima, se for rapariga.
Estes nomes têm o condão de evitarem o fadário. Reportando-me aos índices de
natalidade atrás, não há necessidade de estes nomes virem aos registos com
frequência, até porque nem são nada jeitosos.
- Evita-se que um filho se transforme em lobisomem se
se queimar a primeira camisa que ele vestiu. Como é costume não levado em
conta, não admira que andem para aí muitos…
- Só deixará de ser lobisomem todo aquele a quem
alguém conseguir fazer sangue no rabo ou no dedo mindinho. Nem será
pertinente dizer o sítio onde mais facilmente se poderá dar a pica.
- Quando se pica um lobisomem deve ter-se o cuidado de
não apanhar os salpicos do seu sangue, pois passa o fadário para a pessoa que o
feriu. Se o lobisomem não for bem picado e não sair sangue, aumenta-se-lhe o
fadário.
- Deixa de ser lobisomem se alguém conseguir
apanhar-lhe a roupa e deitá-la a um forno. É óbvio que não será fácil
conseguir apanhar a roupa sem o dito ir a banhos. Talvez nos guarda-fatos lá da
casa, quem sabe?
- Consegue-se apanhar um lobisomem atirando pedras ou
paus à sua sombra. É bom que seja mesmo sombra em sentido literal, não vão ser
apanhados os ministros e conselheiros sombra dos governos. Se calhar nem se
perdia nada…
- O lobisomem transforma-se naquele fado nas noites
das quartas-feiras e sextas-feiras. A alteração das terças para quartas deu-se
para não coincidir com as extracções do euromilhões, mantendo-se a das sextas
por imposição das bruxas, que fazem parte da geringonça que impõe maioria de
votação naqueles quadrantes.
- Os lobisomens correm numa noite sete adros de sete
freguesias.
- O lobisomem come gente, mas só rapazes de idades
entre 1 e 14 anos. Atenção ao item seguinte…
- O lobisomem lança pela boca, nas manhãs das
quintas-feiras e sábados, tudo o que come nas noites anteriores.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.